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Agulhas Solidárias leva roupas para desabrigados no Rio Grande do Sul

Foto: Julia Zonta

Entre o fim de abril e o mês de maio de 2024, o noticiário e as redes sociais de todo o país foram tomados por notícias das chuvas fortes e contínuas que afetaram, segundo relatório da Defesa Civil, 95% das cidades do estado do Rio Grande do Sul. As enchentes, consideradas as piores do estado gaúcho desde a década de 1940, deixaram um rastro de quase duzentos mortos e mais de 600 mil desabrigados. Entre as diversas iniciativas de apoio aos atingidos pelo desastre está o projeto Agulhas Solidárias, idealizado e coordenado pela aluna da Graduação em Moda Rayssa Scherer em parceria com o Departamento de Moda da UDESC. O projeto, que visa produzir peças de vestuário e roupas de cama para as pessoas que perderam tudo na enchente, é realizado aos fins de semana e feriados no laboratório de confecção do Centro de Artes, Design e Moda da UDESC e conta com a ajuda de voluntários em todo o processo. Conversamos com Rayssa sobre essa ação:

OCTA MAG: Em maio desse ano boa parte da população ficou comovida com a situação no Rio Grande do Sul e diversas campanhas surgiram, mas você foi além e criou esse projeto. Como surgiu essa ideia?

Rayssa: Então, o projeto surgiu de uma ideia minha, que eu tive conversando com a minha psicóloga, porque eu estava com uma angústia muito grande de não conseguir fazer nada e só ver toda a desgraça acontecendo. Nessa conversa com ela, começamos a pensar em coisas que eu poderia fazer à distância, que poderiam ajudar. E aí eu lembrei que durante a pandemia o curso de moda em 2020 fez EPI para os profissionais da saúde. Então eu pensei, “ah, bora botar a estrutura da UDESC para a população de novo de uma forma que a gente consiga fazer coisas que eles estão precisando.” No início, o foco não era vestuário, mas itens como lençóis, fronhas, cobertores e mantas.

 

OCTA MAG: Poucas semanas separam o momento em que as notícias sobre as enchentes chegaram na mídia até o início do projeto, como foi possível colocá-lo em prática em tão pouco tempo?

Rayssa: O projeto foi colocado em prática tão rápido por conta do departamento, né? Assim que a ideia surgiu, o professor Lucas e o DMO já conversaram com a RenauxView e para aquele primeiro final de semana a gente já tinha 200 metros de tecido disponíveis para poder fazer cobertores e mantas. E a gente teve um engajamento muito bom também de alunos de todos os cursos do CEART, que levaram metros e metros de tecidos que tinham em casa, que possibilitou que a gente também começasse a produção de lençóis, fronhas e tudo mais.

OCTA MAG: A disponibilização do ateliê é uma parte essencial para a concretização dessa iniciativa e também um dos ambientes mais importantes para o curso, com diversas regras e orientações de segurança para o uso. Como foi o processo para a liberação do espaço?

Rayssa: O DMO, através do professor Lucas, liberou o uso do ateliê nos finais de semana. Mas, para dar continuidade no projeto, a gente iria precisar sempre ter um professor ou um monitor disponível. Então, como o ateliê tinha essa disponibilidade de monitores voluntários, eu entrei como monitora voluntária e eu faço a coordenação tanto do projeto quanto do ateliê enquanto a gente está fazendo mutirão no final de semana. Foi um processo burocrático um pouquinho mais complicadinho, não era algo que a gente esperava ter que lidar. Mas foi muito bem assessorado, digamos assim, pelo Departamento, e a partir da regularização da minha situação como monitora, o uso do ateliê se tornou mais facilitado.

OCTA MAG: Além do ateliê, vocês também conseguiram diversas doações de materiais que tornaram possível a confecção de tantas peças. Como surgiram essas parcerias?

Rayssa: Foi principalmente graças à mobilização do corpo acadêmico, tanto do mestrado quanto do curso da moda da graduação. Além da Renaux View, contactada pelo DMO, a Juliana Sarrico, do mestrado, conseguiu contato com o pessoal do SCMC, e a partir disso o grupo Marlan enviou para a gente 14 rolos de malha. Uma voluntária entrou em contato com a Amanda, da Wondersize, falando do projeto. A gente conseguiu também tecidos da Lunelli, que é um parceiro do curso de moda.

 

OCTA MAG: Em relação à logística para realizar as doações, como eram e são feitas as entregas das peças confeccionadas?

Rayssa: No início, as peças feitas foram entregues para uma associação que estava buscando donativos no TISAN. Depois, fizemos parceria com algumas empresas que já tinham destino para as peças, como a Wondersize e a Lunelli. As peças que a gente fez com o tecido da Lunelli eles encaminharam para um abrigo na Serra Gaúcha. As peças que a gente tá fazendo com a Wondersize, que são plus size, a gente entrega e ela faz um encaminhamento para Porto Alegre, onde ela tem uma pessoa que está fazendo a logística das entregas. E as peças, por exemplo, que foram realizadas com tecidos do grupo Marlan, a gente fez uma parceria com o programa Bem-Viver do Ministério Público, e encaminhou esses lençóis principalmente para eles.

OCTA MAG: Atualmente, quantas peças já foram produzidas?

Rayssa: Já batemos a marca de 1.600 peças.

​OCTA MAG: No início o projeto focava em confecção de peças de inverno, visto que tudo começou nos primeiros meses de frio. Qual o foco atual?

Rayssa: Agora nosso foco está sendo em peças plus size, porque é uma demanda que ainda está muito grande no Rio Grande do Sul, segundo dados da Wondersize. Estamos em duas frentes agora, tanto peças infantis, principalmente pijamas, quanto peças plus size.

 

OCTA MAG: Na divulgação do projeto vocês citam que os voluntários não precisam necessariamente saber costurar para ajudar nos mutirões. De outras maneiras, é possível auxiliar na produção?

Rayssa: A gente precisa de pessoas para fazer a revisão das peças, a contagem, a organização do ateliê enquanto está todo mundo costurando... Dependendo do tipo de peça que a gente está fazendo, precisa também fazer uma conferência de tamanhos, caso a gente esteja trabalhando com tamanhos diversos sendo produzidos ao mesmo tempo. Então são várias funções que fogem da máquina de costura. Tem muita gente que vem com a vontade de ajudar, mas não sabe costurar, e se tiver a vontade de saber costurar, a gente ensina. Se não quiser aprender a costurar ou se não se sente confortável na máquina de costura, a gente tem essas outras posições.

 

OCTA MAG: Como você enxerga os efeitos desse trabalho na sua vida?

Rayssa: Eu, particularmente, me senti muito realizada por poder ajudar essa população que estava em extremo sofrimento, principalmente com aquilo que eu escolhi para a minha vida. Ver como a moda tem essa possibilidade de ajudar e de servir mais do que como um produto, mas como um certo acolhimento nesse momento. Além disso, eu estou levando desse projeto pessoas incríveis que eu conheci no meio do caminho. A gente vê os impactos do projeto também na vida de outros voluntários. Por exemplo, a gente tem uma das voluntárias que sabia costurar, mas não tinha prática com maquinaria industrial. Hoje ela se apaixonou tanto e viu o potencial dela, que é enorme, a ponto de ela ter comprado o maquinário e hoje estar fazendo figurinos.

OCTA MAG: Por fim, quais os planos para o futuro do projeto?

Rayssa: A gente sabe que Florianópolis, onde estamos localizadas, é uma cidade que ainda tem uma questão social muito complicada, que precisa ser atendida. Uma demanda de tanto de vestuário quanto de itens diversos para programas sociais e tudo mais. E a gente encontrou um grupo de voluntários que tem força de vontade para fazer o projeto continuar localmente. Não sabemos ainda se vamos continuar dentro da UDESC, se vamos partir para algum outro tipo de parceria, mas temos uma sementinha de um projeto social que pode nascer para beneficiar a cidade de Florianópolis como um todo. 

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