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Potencialidade política: moda em processo de adaptação e evolução a novos ideais de consumo

por Arthure Giraldo e Nicolas S. Santos

​Vivemos um cenário de “revolucionismo” na indústria, como aponta Lívia Stroschoen Pinent (2018). A moda, muito além de sua função estética e comercial, sempre foi uma poderosa ferramenta de expressão política.

 

A Moda, aqui percebida para além da indústria do vestuário, pode ser compreendida no contemporâneo enquanto “iconosfera” (Meneses, 2003), característica pela comunicação de massas, uma indústria de ilusão que interfere diretamente no dinamismo social. E é a partir da compreensão dessa relação sociocultural entre moda e sociedade que se percebe o papel social e a responsabilidade dessa indústria perante tempos de mudança e evolução das percepções estéticas.

 

Em um mundo cada vez mais consciente das questões sociais, os grupos identitários têm encontrado na moda uma plataforma para disseminar suas mensagens, reivindicações e valores. O cenário contemporâneo testemunha uma crescente e impactante intersecção entre moda e política, redefinindo os padrões da indústria e impulsionando mudanças significativas. Em artigo publicado em 2019 na Revista Dobras por Larissa Molina Alves, pesquisadora da Universidade Federal da Bahia, ela reforça a compreensão de que: em um sociedade tomada pelas redes sociais e ambientes digitais a ascensão de discussões relacionadas à questões como racismo, gênero, sustentabilidade e respeito às diferenças e os direitos humanos, tem assumido papel protagonista nas lógicas do comportamento de consumo.

 

Percebe-se a evolução da relação entre consumo e ativismo. Pessoas de diferentes etnias, tamanhos, orientações sexuais e identidades de gênero estão conquistando espaço nas passarelas, nas campanhas publicitárias e nas marcas de moda. E no cenário nacional são inúmeros os exemplos de estilistas que trazem em sua essência criativa a celebração das diversidades e das identidades não hegemônicas, tendo isso para além do fluxo volátil das tendências.

 

Em 2020, em decisão histórica, e alcançada por pressão da audiência e da própria indústria, o São Paulo Fashion Week institui cota racial obrigatória, sobre a qual as grifes participantes do evento são obrigadas a destinar 50% das vagas do casting para modelos negros, afrodescendentes ou indígenas. O surgimento de eventos como o Brasil Eco Fashion Week, que celebra a moda sustentável nacional, reúne desfiles, palestras, exposições e outros formatos de atividade, com intuito de fortalecer os vínculos entre criadores, empresas e instituições que tenham a sustentabilidade como foco central. Eventos como Casa de Criadores, que tem em seu cerne celebrar a juventude de novos designers, a cultura de rua, a diversidade, e responsável por catalisar a carreira de criadores hoje celebrados na moda nacional como Isa Isaac Silva, Ronaldo Fraga, Robert Dognani e diversos outros. Perceber nesses eventos esse movimento de alteração e revolução reforça a compreensão de “revolucionismo” da indústria.

 

A presença da criadora catarinense, Karoline Vitto , egressa do curso de moda da UDESC, nas passarelas da última Semana de Moda de Milão também reforça a noção de mudança na moda mundial. Natural de Caçador, se formou na UDESC em 2013, e se mudou para Londres em 2016, onde fez pós-graduação na central Saint Martins e mestrado na Royal College of Art. Karoline pensa seu processo de forma inversa ao tradicional. Ao invés de pensar na concepção da roupa para vestir corpos magros e adaptá-los para corpos curvilíneos e gordos, ela os pensa diretamente para esses corpos. Seu desfile em Milão, fomentado por um programa de incentivo a novos talentos, o Supported by Dolce & Gabbana, celebrou a presença de mulheres com corpos reais nas passarelas.

 

Pensar a potencialidade política da moda na atualidade é entender que essa relação é inegável e crescente. Grupos identitários encontraram aqui um meio para amplificar suas vozes e avançar suas agendas políticas. Com a compreensão de que a Moda e os discursos visuais que comanda influenciam diretamente na sociedade, e é ao mesmo tempo influenciada por ela, numa ação constante de ação e reação, fortalecer as forças de mudanças percebidas no contemporâneo, buscando por uma indústria da imagem e uma sociedade mais diversa e inclusiva, se faz essencial. À medida que a indústria se torna mais inclusiva, consciente e engajada, podemos esperar que seu impacto político continue a crescer e moldar um futuro mais igualitário e diverso. A moda, muitas vezes vista como superficial, revela-se, na verddade, como uma força poderosa para a mudança social.

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